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terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Amores de Verão

“Amores de Verão enterram-se na areia” A frase toma sentido quando no Verão conhecemos novas pessoas em momentos por vezes fortuitos, pessoas que pela diminuta quantidade de roupa nos parecem mais atraentes. Findo o Verão sabemos ter que esquecer essas pessoas, acabam-se as férias, voltamos para casa e esquecemos o que se passou. Com a devida razão que lhe é atribuída devia ser fácil cumprir com o ditado, e antes fosse!
Acontece que no Verão também surgem daquelas pessoas que nos deixam siderados como algo sério. Também com meros acasos passamos a conhecer alguém deslumbrante, interior e exteriormente, passamos alguns dias divinais e depois acontece a inevitável partida de uma das partes. Até aqui tudo normal, passado um ano não há regresso mas as saudades não arredam pé, a chama mantém-se viva como na partida.
Passam 2, 3, 4 e só ao fim de 5 anos acontece o regresso, agora já com alguém a seu lado, sem tempo para matar saudades, nada mais além que breves trocas de palavras. O destino trai as nossas ambições no seu percurso regular, umas vezes o bom, outras vezes o mau da fita, ele é assim mesmo e nada pode ser alterado, “maktub”.
A nova despedida, de início simples, torna-se pesada com o aparecimento do silêncio constrangedor, apesar de a parte que vai partir novamente se aguentar bem, já com vida traçada e rumos minimamente definidos em torno não da vivência mas da sobrevivência. A parte que fica inunda os olhos de um brilho pesaroso de quem sabe um reencontro para muitos anos depois ou talvez para nunca mais. “Boa viagem” é tudo o que sai.
Os 5 anos de espera não foram calmos, nada nunca fez apagar a chama que se acendeu nuns meros 3 dias. A paixão está presente, o resto do sentimento confunde-se entre o amor e a obsessão. Momentos duros os de recordar a beleza escultural e completa do corpo e a simplicidade amorosa da alma. Pode não saber falar inglês, pode não gostar da aldeia, pode até nunca ter ouvido falar nos U2 mas a sua simplicidade apaixona.
Foram 5 anos de ideias arrojadas e obsessivas, ideias de largar tudo para estar perto dela, ideias às centenas das quais não escaparam para a realidade mais que umas simples mensagens de amor ou umas cartas sinceras, manifestações que nunca levaram mais que uma bela resposta de amizade, uma amizade que tortura e que não podia existir. Ideias que nunca foram postas em prática, ou pela cobardia ou (por outro ponto de vista) pela capacidade de perceber que qualquer desses gestos nunca levaria o devido valor da outra parte, ideias em vão.
5 anos depois, após o reencontro e após a despedida, surge o arrependimento pelo desejo de a voltar a ver. Uma chama que se julgava um tanto ou quanto adormecida após anos de rescaldo, voltou a avivar-se, a tomar fulgor e a ferir uma ferida nunca sarada. Vale a nova vida da parte que fica, uma vida recentemente recheada de gente nova e de tal modo ocupada (ou com o trabalho ou com o estudo) que deixa pouco tempo para juntar pensamentos ao monte dos desperdiçados.
Salta-se da imaginação para a realidade e percebe-se que só com muita sorte à mistura é que um amor impossível deixa de o ser. A ele não resta nada mais que disfarçar com alguém valioso a lacuna que nunca será completamente preenchida.
Houve em tempos paixonetas por raparigas bonitas mas isto em nada se assemelha a isso, hoje ele cresceu, sabe distinguir um fraquinho de um amor e é capaz de dizer que aparte dela nunca amou ninguém. São palavras sinceras gastas em vão com pessoas que não lhe vêem o devido significado à semelhança do artista que fica cabisbaixo ao notar a errada percepção do significado da sua obra de arte. Quem escuta estas palavras incita a partir para outra, outra mesmo que seja uma amiga. Ele sabe, por experiência própria, que as duas coisas não se devem misturar e fica perturbado com a ideia, tanto mais que ele sabe a necessidade de ter alguém a seu lado mas prefere esperar pela pessoa mais adequada para ocupar o lugar dela.
Há pensamentos que transcendem a superficialidade do desejo sexual imediato mas ninguém quer olhar para isso senão quando assistem a um filme. Ele tem medo de não ser compreendido e de não ser bem interpretado, quando encontra alguém que quase lhe lê a mente, alguém de um profundidade impressionante vastamente ao seu nível, essa pessoa esvai-se-lhe por entre os dedos como areia fina e seca por entre desculpas de indisponibilidade e anti-depressivos. Ele sabia não advir daí a melhor satisfação das suas necessidades do sexo oposto, mas outras aventuras em que o desejo sexual pode ser completado revelam-se insossas, sem personalidade e sem profundidade de intelecto. Duas partes essenciais mas separadas em pessoas diferentes.
Acontece demasiado frequentemente, juntam-se duas pessoas diferentes, que não se completam, têm sexo duas a três vezes por semana, jantam com a família dela ao sábado à noite, e vão ao cinema, almoçam com a família dele ao domingo e repetem este ritual até terem casa própria, altura em começam a tratar da própria vida em casal. Vão para a cama e viram-se um para cada lado. No dia seguinte ela leva os filhos à escola, ele vai trabalhar. À noite trocam meia dúzia de acusações aos berros e terminam a refeição em silêncio dormindo novamente como que em camas separadas. 90% das relações seguem estes trâmites, uma vida sem sabor e sem sentido. Ele não quer ser assim e sabe que vai sofrer por causa disso, mas não se deixa abater, mesmo sabendo que não a volta a ver ou que nunca a terá seu lado da maneira que deseja ele espera encontrar alguém que o complete para além do corpo.
Deverá aproveitar a vida só porque é jovem e viver aventuras sem futuro? Ele gostava de saber mas não tem quem lhe responda e sabe que esta pergunta é só mais uma sem resposta. Por ora preocupa-se com o presente e com a forma de ultrapassar os obstáculos do dia-a-dia, ter pensamentos verdadeiros e profundos num mundo cru e insensível é coisa a que só se pode permitir sozinho ao adormecer, quando o tempo não tem valor e quando pode estar sozinho e à vontade com a única pessoa que realmente o compreende – ele próprio. Agora vive um dia de cada vez, porque no início da sua fase adulta sabe que dar passos grandes exige muita preparação, coragem e consistência no saber o que está a fazer, prefere passos pequenos que sabe não resultarem em mais do que quedas pequenas.

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