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terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Sadness

É triste quando estamos sós, mas mais triste é quando nos sentimos sós quando estamos rodeados de gente. Uma semana de férias em que vi e revi muita gente e sinto-me só e aborrecido.
Eu gosto muito de pensar e faço-o. Sou observador nato e procuro uma razão de ser para o mínimo pormenor, que não seja o acaso. Nessa minuciosa observação há muitos e longos momentos de profundo pensamento em que me apercebo de realidades tão óbvias ou simplesmente de factos que se realçam pela natureza dos acontecimentos à volta dos quais eu me centro. Desta feita vi em mim não a falta de uma mulher em sentido corporal mas aquilo de que mais sensatamente se pode chamar amiga. É deveras complicado conseguir achar alguém cujo fundamento intelectual se assemelhe ao meu, e nas raras vezes que isso acontece eu consigo estragar tudo pela atracção física que acaba por se gerar. Não uma atracção baseada na beleza física mas sobretudo baseada na necessidade mútua de cumplicidade do sexo oposto. Não consigo mais do que escassas horas de diálogo coerente de igual para igual, passado este curto prazo ocorre a cumplicidade e posteriormente o afastamento. O afastamento é simplesmente prova do receio de ambas as partes da possibilidade dos débeis sentimentos poderem tornar-se mais fortes e do receio de que a falta de maturidade dê asas a uma relação sem estrutura.
Fala-se num desenvolvimento precoce das novas crianças que de todo não foge à realidade. No entanto a falta de privação da comodidade do nível de vida actual e o comodismo tremendo que afectam a sociedade, levam à evidência de um infantil atraso no desenvolvimento da maturidade. As crianças iniciam cedo a aventura do conhecimento mas começam cada vez mais tarde o desenvolvimento próprio de maturidade e de capacidade de decisão própria. Este problema assemelha-se a uma comum ideologia de que os medos só são vencidos quando enfrentados. A maturidade é a vitória sobre os medos. Os actuais jovens, por virtude da evolução, do excesso de proteccionismo dos pais e da significativa melhoria do nível de vida, demoram cada vez mais a tomar vida própria. Os jovens são postos à prova de forma tardia e ineficaz. O mundo da fantasia é cada vez maior e mais abrangente e a maturidade tarda em se evidenciar. Não é portanto de admirar que as relações pessoais sejam cada vez mais instáveis, sujeitas a sobressaltos por futilidades e ninharias, curtas e impessoais. O casamento é feito pela necessidade periódica de sexo e acaba naturalmente por se desmoronar em poucos anos deixando o mundo a braços com crianças orfãs de pais vivos. Tudo é feito com base nas necessidades imediatas porque o amanhã é cada vez mais imprevisível e incerto. Surgem cabalmente ideias de viver a vida. É possível viver a vida dentro de valores morais e de respeito para com o próximo mas já toda a gente se esqueceu disso. Alguém com ideais auto e hetero-benéficos, com um mínimo sentido altruísta e sentido de respeito é banalmente ultrajado na sociedade pelos seus semelhantes.
Já não existe amor que não seja sexo, aliás, nunca houve. É surpreendentemente impossível encontrar uma palavra certeira, que coincida com a nossa teia organizacional e com o funcionamento do desenrolar da vida. Ouvir uma palavra amiga é coisa de filme. Ou então custa-nos uma consulta no psicólogo. Sinto-me só mesmo com tanta gente à minha volta. A vontade de pensar sequer na prossecução do trabalho é assustadora. Só tenho vontade de dormir, dormir e dormir. Dormir e desabafar. Mas é muito difícil encontrar alguém a quem eu faça valer o meu raciocínio, alguém que saiba mesmo o que eu quero dizer, alguém que pense, alguém que não interprete as minhas palavras com duplo sentido ou com sentido errado. Bem posso morrer seco à espera dessa pessoa. Enquanto isso vou deixando o meu eu ir gritando a plenos pulmões que eu não estou bem e que preciso de ajuda. Já que não posso gritar a sério sem que considerem a minha atitude paranóica vou gritando em silêncio, vou deixando do meu espírito brotar as lágrimas de sangue de quem morre com o coração a bater, a falar e a comer por sua própria mão. Reduzo-me subtilmente à minha insignificância porque ela é verdadeira e deve ser respeitada por forma a que ninguém seja mais do que deva ser. Mas claro que esse respeito não existe.

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